domingo, 31 de agosto de 2014

31.08.14

Das coisas cristalizadas das quais sinto saudade, uma fortemente arrastada pelo fundo da mente é a imagem da porta abrindo, no apartamento antigo, e o quarto de brinquedos ganhando espaço. Uma época onde o caos e a mentira não perturbavam. A pele que tocava o solo às vezes se sentia machucar pelas formas dos tantos objetos espalhados: eram muitos, tantas cores, tantas histórias, tantas possibilidades. E as paredes escorrendo pra baixo, vazias, nada no horizonte, tudo ao chão, indefeso, tudo à mão, tudo esquecido, porque viver assim é sempre mais doce que estar alerta. Quero meu quarto de brinquedos de volta. Minhas bonecas, que me mentiam tão bem, e eu nunca me importava, eu sempre acreditava nelas, no que elas diziam, tanto quanto acreditava no que não diziam. Um quarto de brinquedos esquecido das normas, da limpeza, das regras, dos lugares certos, e os cabides de brinquedo tão livres quanto eu jamais seria, jogados, sim, era bom estar jogada, esquecida pelo lado de fora do quarto, lá dentro tudo era paz, tudo era um convite, um abraço, um choro falso de criação, uma história de amor que terminava bem, os bebês quietos, nunca sentindo frio, nunca sentindo calor, a perfeição da morte: o bebê só chorava se eu estivesse preparada pra consolá-lo.