quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Um lugar nas sombras.

Às vezes buscamos o escuro, sem encontrá-lo.
Mesmo virada para si a luz ainda invade.
Não podemos tocar a nós mesmos como se fôssemos outro.
Nunca vamos descobrir. Prefiro então,
me esconder em algum lugar cujas paredes
são simbólicas.
Quero conhecer com as mãos a mim mesma.
No entanto, se os olhos nunca fecham
há de se acreditar que o escuro
é um lugar que não existe.

Finalidade

Pensar não serve pra nada quando esperamos chegar a uma conclusão.

Só uma mais.

Mais uma dose, por favor..
que é pra desconstruir,
abrir e quebrar,
esquecer de fazer.
Uma dose só pra encarar,
ou não se importar
em não ver.
Só mais uma pra aguentar
essa psicose do lado de fora
da cabeça.
Mais uma e eu silencio, prometo,
finjo que esse mundo já foi,
mesmo ele tendo caído
em cima do meu pé.

Deserto

O deserto é largo.
E não se define, não se contorna, não se diz.
Eu estou sentada no meio do deserto.
Estou sentada na trilha imaginária do deserto.
38 graus me separam da realidade.
38 graus me separam da minha realidade.
Estou de joelhos no deserto.
Não pude contar quantos grãos de areia
fincaram-se na minha pele,
já nem os sinto.
A crueldade do deserto
é ter a noite fria,
como quem nos mente
durante o dia ou
durante a noite.
O peito carregado
e a mão vazia,
senão o oposto.
Não há ninguém no deserto.

sábado, 25 de janeiro de 2014

O outro lado.

Sem uma palavra que dissesse,
se cala, não podendo
traduzir aquilo que queima
sem nunca tornar-se cinza.
Sem nunca saber dizer
se cala.
Ironicamente,
há milhares de palavras no fogo.
Movem-se à revelia,
não conhecem mais
seu sentido.
Não precisam.
Não há espelho
que atravesse os olhos,
ainda que muito abertos.
Espelhos psicológicos
só pra saber que
vivemos.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Um dia sem fim...

Como um dia que não quer ir embora, 
o sol relutante, impassível,
sua luz longínqua, potente, incansável. 
Não, eu não ousaria usar pronomes. 
Cegado de luz, sou apenas uma natureza
que se derrama na terra
e some.
Nenhuma mão veda a luz, 
ela sempre consegue escapar, 
acabo acreditando
que a noite é só um sonho
e que só nele se respira.

sábado, 18 de janeiro de 2014

Sem nomes.

Não é que eu não seja dual, é que prefiro bagunçado. Conhecer de olhar, sem referências ou comparações. É que ando perguntando porque temos que nomear, entender, concluir. Aquilo que está bagunçado só pode ser percebido bagunçado, organizado é outra coisa.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Aceitar

Não é que se seja um pior caminho. Aquele que se vai sozinha. É só um se acostumar com a realidade. É só um aceitar que se morre. É simples como um bicho que nasce, a mãe que o defende sem drama. A agressividade pensada no corpo da mãe. O choro que corta o silêncio em pedaços. 

Visita

Que importa o problema? A tristeza é uma música que se toca infinitamente. Que importam as lições? Se o que te sobra é a carne? Porque não existe outra realidade que não a psíquica. Não adentramos outro mundo, porque não há. A quem se entregam as desesperanças? A que deus suicida se entregam as desesperanças? Que sombra nos acompanha, sem nunca nos fazer companhia? Fantasma de mil faces, te vejo escuro, apagado. Por instinto, sinto sempre teu cheiro. 

sábado, 11 de janeiro de 2014

Open up.

A escrita, minha cocaína lenta. Esse abismo em movimento, tontura, confusão, tudo se percebe, nada se reconhece. Esse deixar chorar. Vou morrer pensando que queria entregar minha vida à alguém. Não por amor. Mas por não poder suportar. Todas essas vozes que dizem antes de mim o que eu queria dizer. Eu sequestrada. Toda essa parede no lado de cima do mundo. Vou morrer sem entender por que ela veio. Por que ela existia. Por que ela me tocava o tempo inteiro. Esse querer crer que uma questão possa ser resolvida. Esse buscar de questão. Esse encontrar de palavras excessivas, emoções excessivas, apatia excessiva, esse olho que corta. No mundo, resta a ilusão, não há saída além dessa. Não nos fizeram possíveis. Não nos fizeram possíveis. 

Just a secret...

Não é que faça psicologia pra curar os loucos. Longe disso. Faço mesmo é pra aprender como ser um deles.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Uma outra.

Às vezes a solidão é tanta que agride.
Às vezes aceito e ela se torna outra, que me acompanha. 
Ela enxerga com o olho embaixo do meu olho.

Infinitamente

Alguém me disse que a morte é doce e calma e lenta e que te chama pelo nome, suave, baixo, como quem não quer te acordar.
Mas às vezes parece que a morte é como esquecer uma panela no fogo e dormir, com todos esses assuntos mal resolvidos que de repente assentam no lugar errado do peito, derramam no lugar errado do corpo, como o leite derrama.
.....
Que mal há em desejar um pouco de escuridão e silêncio, se isso for tomado simbolicamente?

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Livro Castanho, I

172 pessoas,
ou pares de olhos
desviados
de mim.

O choro
perdeu-se,
uma agulha que costura
e aumenta
uma cicatriz esquecida
inconsciência.

Úmida
a terra faz da boca
uma cova.
74 facas
perto de mim.

Poema de Daniel Faria

"Sou gêmeo de mim e tudo
O que sou é
Distância.
Estou sentado sobre os meus joelhos
Separado.
Aquilo que me une
É um rumor.
Não descanso. Sou urgência
De outro sítio. E pudesse velar-me
Longe
Dos homens como se neles
Adormecesse."

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Neurose

Passar os anos escrevendo sem conseguir expressar uma palavra sequer. Às vezes encontramos no silêncio mais daquilo que eu queria dizer. As palavras organizam o que não é organizado, por que então nos enganar a respeito?

O silêncio

A voz toca o corpo antes da boca.
O ar corta a pele pelo avesso.

sábado, 4 de janeiro de 2014

Herberto Helder, Tríptico II

Não sei como dizer-te que minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
vasta e esplêndida.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante, 
e na terra crescida os homens entoam a vindima
- eu não sei como dizer-te que cem ideias, 
dentro de mim, te procuram. 

Quando as folhas da melancolia arrefecem com os astros 
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada 
em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão 
como se toda a casa ardesse pousada na noite.
- E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio, 
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
- não sei como dizer-te que a pureza, 
dentro de mim, te procura. 

Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstrato 
correr de espaço - 
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega 
dos meus lábios, sinto que me faltam 
um girassol, uma pedra, uma ave - qualquer 
coisa extraordinária. 
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto, 
a criança, á água, o deus, o leite, a mãe, 
o amor, 
que te procuram. 



quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Sobre a solidão, a loucura e a lâmina.

O desespero vem quando chegam as muitas vontades, se entrelaçam, se engolem, se misturam numa só. O desespero vem quando a vontade de gritar chega junto da vontade de chorar, que chega junto da vontade de bater, e de calar, e de morrer. Tornam-se um estranho parasita, embolados, espreitando sem descanso, escolhem a gente pela nossa fragilidade e predisposição à loucura. Uma vez que somos escolhidos nunca mais reconhecemos a realidade. Paramos, quando cansamos de nos perguntar. Paramos quando podemos andar um dia inteiro com os pés descalços, sentindo a terra, sentindo o corpo, sentindo o simples. A solidão não incomoda as pessoas desajustadas. O que incomoda são as poucas vozes que chegam. Desestabilizam, fazem desconfiar, e também fazem acreditar que há possibilidade para a mente humana, quando na verdade ela é um engano, é um tiro escutado de longe durante a madrugada.