Desenhávamos janelas pelas paredes
e o sol aparecia, ou era o calor de
sonhar.
Guardávamos na gaveta as navalhas
e todos os relógios da casa,
fingíamos estar molhando os pés
em todos os delírios, e o vento
aparecia, ou era alguém soprando
palavras, poemas, a areia do
deserto.
Mentíamos tão bem o silêncio
doméstico, enquanto os animais bebiam
água como só os desesperados bebem,
costurávamos tão agressivamente as
fissuras na carne, perdíamos todos
os pontos de junção, de união, de
depositar a palavra em outra
boca.
Continuamos, crescendo o barulho
dos relógios, afundando os cortes
das navalhas, mentindo mais
desesperadamente, guardando as
fissuras nas gavetas, soprando todas as
palavras, mergulhando os pés no
deserto.
Sonhando.