segunda-feira, 7 de setembro de 2015

07.09.2015

O cheiro do leite morno que bebi na tua casa, a iminência da idade avançada, navalhas reluzentes, no meu peito foi diluído o peso das coisas com água quente e talvez açúcar, talvez eu até tenha bebido, ou talvez tenha sido tequila, ou quem sabe algum veneno de rato igualmente dissolvido: até que se faça o efeito será impossível saber: as coisas são assim: até que se faça o efeito elas são a mesma coisa. O plano era te matar muito manso. O plano era te tirar o ar porque você não sabia o que fazer com o ar. Mas eu só ouvia ruídos de afogamento: você sempre se debatia, isso era você, um bicho perdido, um prestes-a-morrer-eternamente, você era um barulho chato avisando que tudo terminava. Era difícil. Eu não tinha força nas mãos para a grossura do teu pescoço: não tinha tamanho para a tua esmagadora existência, e nem por isso deixava de te tocar. A mão ardendo nas articulações e eu não podia desistir: tudo estava tão alheio à tragédia e qualquer deslocamento de cena seria como uma explosão fora do tempo cronometrado. Eu vou te matar manso, sem dor, ou sangue, ou apenas um filete mínimo que será o suficiente pra te escoar desse lugar que é você, e apenas por uma necessidade sentimental sem grandes comoções, eu vou te matar envolta em tule, algodões, chás alucinógenos, e sem gritos assustados, meus terrores noturnos já estão bem silenciosos, tem dias que não escrevo poemas, e também tem meses que planejo tua morte sem dores, sem sangue, sem cortes, nada que berre amor, apenas um cansaço que vai deixar a mão macia na hora de fazer você ir embora.